31 de jul. de 2009

Refeição

Vez em quando ele come jiló. Só para lembrar que existem coisas bem mais amargas que sua vida.

Sabrina Davanzo

30 de jul. de 2009

Presente

Henrique Pimenta, do blog Bar do Bardo, presenteou-me com este lindo poema que compartilho com vocês:

Encantamento

- para a fada Sininho

Libélulas e sílfides em cruza,
fadinhas, borboletas, colibris,
um grumo de inocência na confusa

folia do jardim, como se diz
em época de amores "eu te adoro",
os seres e os encantos vão de bis

e tri e... não se cansam do canoro,
em nuvens de cantata para mim:
adentro no brinquedo que ignoro,

um anjo poliniza-me e... jasmim.

- Henrique Pimenta

Obrigada, Henrique! É lindo... estou encantada!

Alice



Eu me recuso a enxergar esse mundo cinza, poluído, com pouco rio para nadar, com cada vez menos árvores para me proteger do sol e menos ainda comida nas mesas.
Eu me recuso a acreditar que um pai não tem tempo de ver seu filho crescer porque está ocupado ganhando dinheiro e comprando apartamento de um milhão.
Hoje eu não quero ouvir sobre o castelo do político. Se for para falar de castelo, que seja sobre os construídos na areia, de brincadeira.
Hoje eu não quero saber se uma bomba explodiu no Iraque, porque isso simplesmente não deveria acontecer: mais que um atentado a um pedaço de terra e algumas vidas, esse ato é um atentado a felicidade do mundo.
Não me faça entender como um lugar tão grande como nosso planeta não tem casa para acolher todas as famílias, fazendo com que algumas delas tenham que morar nas ruas. Será que Deus errou nos cálculos? Ou foi a ganância que ocupou mais espaço? Nem me lembre dos cobertores de jornal dessas famílias. Só me mostre as tirinhas engraçadas e as palavras cruzadas.

Não me peça para imaginar chuvas que inundam casas e destroem tudo... só consigo imaginar chuva de bênçãos sobre cada cabeça cansada de tanta luta.

Ainda teimo em notar a diferença nas cores do céu, no por do sol e nunca na pele das pessoas que me cercam.

Hoje eu quero recolher todos os cachorros abandonados e coloca-los em casinhas de madeira confortáveis.

Quanto as crianças abandonadas, levarei todas para o parque de diversões, de onde nunca deveriam ter saído. Deverão manter um sorriso no rosto, enquanto forem apenas crianças nunca saberão o que é trabalho.
Não, eu não vou ligar a TV para assistir jornalismo sensacionalista e estúpido. Ao invés disso, vou confiar nos cientistas inteligentes e cultos que buscam a cura das doenças, alivio para as almas.
Eu prefiro a utopia. Estou de mudança para o Pais das Maravilhas. Quero voar com Peter Pan, viver na Terra do Nunca. Vou organizar uma revolução industrial nas fábricas de chocolate.

Há quem diga que fujo da realidade, mas me diga: Você QUER continuar vivendo aqui? Esperando ansiosamente que, ao sair de manhã, você volte seguro para a casa? Desejando que não seja hoje o dia em que aquele cara vai cruzar seu destino e levar sua carteira, sua identidade e talvez sua vida?

Estou cansada de agradecer por mais um dia “sobrevivido”, enquanto alguém cai no chão para nunca mais se levantar vitima de uma bala perdida.
Definitivamente, eu queria que o mundo fosse o meu quintal e não meu cantinho do castigo.

Ps: Será que esse mundo ainda tem jeito? Será que ainda dá tempo de fazer alguma coisa?


Sabrina Davanzo


24 de jul. de 2009

Purifica



A previsão do tempo é de chuva. Vou aproveitar para lavar minha alma com essa água que cai do céu. Tomara que Deus olhe para mim e veja que é de bom grado que recebo cada gota de purificação.
E quanto a você, chuva... desmancha com sua força mais que minha maquiagem ou penteado, desmancha minhas ilusões. Enquanto limpa minha pele, limpa também minha visão deturpada e me faz enxergar a realidade. Arraste com você o que não me pertence, o que não faz parte de mim, só assim poderei ser eu mesma. Caia o quanto quiser, o quanto for necessário para que eu me torne outra vez fértil. Não importa o quanto dure... eu acredito e confio que depois vem a luz do sol, igual toalha quentinha, para me aquecer.
Amém.

Sabrina Davanzo



23 de jul. de 2009

Sorriso estranho

Quando chegou à festa vestida toda de preto com uma meia-calça rosa bebê, todos notaram. Ainda bem. Reparando a meia, não notaram seu sorriso cinza e suas olheiras roxo-esverdeadas. "E essa meia de quando você tinha 12 anos?", alguém perguntou. "Está com saudade do seu tempo de bailarina?".
Ela usava a meia para disfarçar o clima fúnebre dentro dela. Constrangida com as brincadeiras, acabou indo discretamente ao banheiro retirar o motivo dos comentários.
Saiu e encarou outra vez os amigos. Agora, parecia pior. Exposta, sua pele branca, pálida, parecia nem ter sangue correndo nas veias. Tremia de frio e de medo. Não queria encarar aqueles tons escuros que teimavam lhe colorir.
Ele se aproximou dela e, com paciência, lhe perguntou: "Por que tirou a única coisa que lhe trazia um pouco de vida? Você precisa ficar alegre. Com as meias, você parecia sorrir. Ainda que com as pernas..." Ela lhe olhou desconfiada.. achou estranho e engraçado. Ele lhe conduziu aos empurrõezinhos e pediu que tratasse de vestí-la de novo.
Foi o que ela fez. Quando saiu, tímida, tinha um imenso "sorriso" cor de chiclete. De alguma forma, aquilo lhe deixou feliz.

Sabrina Davanzo


21 de jul. de 2009

Nascimento



Observavam o jardim ao entardecer. Os últimos raios de sol estabelecia uma cumplicidade alaranjada entre eles. Diante de uma roseira, ele sorriu, apontou para as flores que exalavam vida e suavidade e lhe perguntou: "Qual delas é você?". Com o olhar mergulhado em água que teimava em brotar, tocou um pequeno botão, tão fechado dentro de si que mal podia respirar, mal podia ser notado em meio a toda exuberância desabrochada a sua volta. "Sou esta aqui", respondeu num sussurro.
Observando-a com um misto de pena e admiração quis saber por quê. "Porque apesar de existir, ainda estou para nascer".

Sabrina Davanzo

Contra-tempo


Hoje ela tem pressa apenas para ser feliz. Não está correndo contra o tempo e não quer que nada ao seu redor seja assim. Para ele as horas são apressadas, então a procura por cinco ou dez minutos nem que seja para saber como ela está. Houve um tempo em que ele parecia ter a vida inteira para ela. Não. Ela não quer se conformar com o pouco que ele quer lhe oferecer agora.
A sua pressa é boa. É pressa que espera pelo o que ainda vai acontecer. Então ela lhe pede: Não atrapalhe minha calma de viver com sentimentalismos fora de lugar. Eles apenas roubam minha esperança por segundos e fazem com que eu me sinta vazia o resto do dia.

Sabrina Davanzo

10 de jul. de 2009

Acabou


Um dia eu experimentei felicidade. Era doce e, como tudo o que é bom, acabou rapidinho.


Sabrina Davanzo

7 de jul. de 2009

diagnóstico



Todo dia sentia uma dorzinha no coração, umas pontadas. Piorava a noite. Falaram que podia ser angina. Não era não. Ela sabia que o órgão lhe doía era de solidão.

Sabrina Davanzo

6 de jul. de 2009

Sorry

Todo mundo vem com um manual. Alguns, em inglês. Desculpe. Eu ainda não falo outra língua.

Sabrina Davanzo

Instruções


Rio que corre para o mar

lava minh'alma
sem me arrastar

margem que me mantém no lugar
segure-me
por favor, sem sufocar

lodo que cobre meu interior
acomode-se
de forma que eu não sinta dor.

Sabrina Davanzo

5 de jul. de 2009

Bandeira branca


Hoje meu espírito saiu em protesto em meio ao caos que se instalou nas avenidas de minha vida. Solitário, bradava gritos inaudíveis. Implorava por paz.

Sabrina Davanzo

1 de jul. de 2009

Faxina

Às vezes penso que o mundo necessita mais de consciência limpa do que de paz.

Sabrina Davanzo

29 de jun. de 2009

Dos livros que eu li

Acabei de ler O Som do Pasquim. Uma coletânea de entrevistas históricas de cantores como Tom Jobim, Chico Buarque, Luiz Gonzaga, Raul Seixas, Waldick Soriano, concedidas ao jornal O Pasquim, na década de 70. Achei super interessante. Dá para conhecer um pouco mais essas personalidades e também a realidade do mundo da música e do Brasil naquela época. Nas entrevistas, eles falam de suas músicas de sucesso, polêmicas. Deu vontade de sair ouvindo uma por uma. Foi o que eu fiz. Fantástico. As entrevistas são sempre marcadas pela irreverência do pessoal do jornal: Jaguar, Ziraldo, Millôr. Muito bom, vale a pena ler.

"A minha casa fica lá detrás do mundo
Onde eu vou em um segundo
Quando começo a pensar..."

Lupicínio Rodrigues ( um dos entrevistados)

Confiram o hotsite: O Som do Pasquim

Sabrina Davanzo

Inundação


Sou barragem que segura águas inquietas, revoltas. Um dia acaba que não me aguento: rompo.

Sabrina Davanzo

Sem destino


Como uma frágil e pequenina pétala, estou a voar ao sabor do vento. Não há muito o que eu possa fazer a não ser esperar que ele perca sua força para só então me deixar parar, para só então eu entender onde eu deveria chegar.

Sabrina Davanzo



Por perto

Ela esperava por ele como quem espera encontrar um oásis no meio do deserto. Resistia tentando manter sua dignidade, tentando não se perder rodeada de tanta ausência.
Então, numa tarde de nuvens escuras, ele apareceu. Chegou quando o mundo todo já havia ido.
Ele entende seu coração. Por isso, trouxe no sorriso o ânimo e a tranquilidade que ela tanto precisava.
Ele, que sempre está longe, é o primeiro a se fazer perto. Ela não precisa pedir. Ele sabe quando deve aparecer.

Sabrina Davanzo

26 de jun. de 2009

Raridade

Quanto mais eu cresço, menos amigos tenho. Quanto mais pessoas conheço, mais superficial se torna minha relação com elas. Lembro de uma época onde eu não concebia estar entre amigos e não abraça-los. Era impossível não existir intimidade. A proximidade física implicava cumplicidade, sintonia.
"Bom dia", "tudo bem" não eram obrigatórios caso o dia não estivesse valendo a pena ou a vida não estivesse lá grandes coisas.
Não se faz mais amigos como antigamente. Daqueles que você ganha não só atenção, mas colo. Já tive amigos de passar tardes pulando na cama imitando uma cantora mexicana sem saber falar espanhol. Já tive amigos de dividir a mesma lata de "leite moça" sem o menor receio pois havia confiança. Hoje, mal divido um sorriso, uma angústia.
Amigos como atigamente estão cada vez mais raros. Difíceis mesmo de se encontrar.
O que aconteceu? O mundo mudou? Ou será que fui eu?
Eu não sou mais a menina divertida e legal que eu era? Ou as pessoas não tem mais tempo para serem amigas?

Sabrina Davanzo


23 de jun. de 2009

Singelo:inocente;puro



Num dia desses, enquanto falava ao telefone, resolvendo um desses assuntos que parecem mais de morte do que de vida, eu fitava a imensa janela que tem na sala de casa e que dá para uma espécie de pátio. Absorta pela conversa, qual foi a minha surpresa quando de repente, com uma suavidade que não sou capaz de transcrever, um avião de papel corta o céu e pousa bem ali naquela imensa área do prédio. Tal foi a delicadeza do pouso que fiquei imaginando quem haveria de ser aquele piloto tão cuidadoso. E mais, quem teria enviado aquela aeronave de contornos tão perfeitos para perto mim? Emocionada com a simplicidade desta cena ante a complexidade da conversa ao telefone, comecei a sorrir e comentei com um que de anestesiada: "acabou de pousar um avião aqui.... o avião mais lindo e singelo que já vi". Sem entender nada, quem estava do outro lado da linha quis saber se eu estava bem ou se já começava a variar. Pedi desculpas e desliguei. Corri para a janela. Queria ver mais de perto o avião feito de folha de caderno. Que bobagem pareceu as tramas e os dramas em que me via envolvida. Aquele pontinho branco estacionado a alguns metros me mostrou que a vida pode ser mais leve, pode ter o peso de um avião de papel se a gente quiser.

Sabrina Davanzo


Invisível



A relação dos dois é como criança-escondida-atrás-da-cortina-com-o-pé-pra-fora. Ele sabe que ela está ali, mas finge que não vê. Lamentável dizer que não é para tornar a brincadeira mais emocionante. Ele age assim há mais de vinte anos.

Sabrina Davanzo