6 de jan. de 2009

Desassossego


Agora ela se sentia plena.
Caminhava à beira da praia e respirava o ar mareado que vinha do horizonte infinito.
O sol lhe emprestava uma cor dourada encobrindo-lhe a palidez. O vento fazia alegria em seus cabelos. Era a perfeição da coisas divinas. Lembrou-se de agradecer a Deus. Sim, ela havia feito as pazes com ele. Já podia confiar em suas decisões. “A vida é uma grande decepção” dizia ela antes da reconciliação.
Perdera um grande amor. O maior deles: o amor próprio. Esse foi o primeiro passo para as outras grandes perdas: amigos, trabalho, apetite.
A família se preocupou: “tão jovem, tão bonita... qual a razão de tanta tristeza?”
Levaram-na ao médico. Stress, estafa, deprimida. Indicou terapia, remédios para dormir, acalmar, relaxar.
Não. Não era o que ela procurava. Tudo o que ela menos desejava era a calma dos dias, o sono silencioso das noites. Ela queria experimentar a intensa vontade de estar viva.
Sempre aqueles mesmos hábitos, cansava.
Logo quando ela se inquietava, uma tarja preta queria lhe trazer de volta. Pequenas pílulas de falsa realidade: “CONFORME-SE COM SUA VIDA E ESPERE PELA MORTE”. Não se contentaria com essa sentença.
Deixou as pílulas de lado, parou com a terapia. Até acreditava na eficácia do tratamento, mas para ela, ter apenas um dia da semana, apenas uma hora desse dia para se esvair e voltar ao normal em seguida, era muito pouco.
Decidiu tentar sozinha.
Comentavam que o isolamento era pior. “Poderia acabar cometendo... você sabe...”.
Mas ela já havia chegado ao limite de sua entrega. Não seria capaz de se acomodar ao fundo do poço. Sabia que mais cedo ou mais tarde teria de se erguer.
Procurou a saída com suas próprias mãos. Não esperou pela corda. Talvez ela nunca viesse.
Voltou exausta. Marcada pelas dores de se recuperar sem uma mão amiga estendida.
Visitou a escuridão da alma, os monstros criados e alimentados por ela mesma e só então entendeu a magnitude do existir.
Quis ver o mar. De alguma forma, ele era a representação do que ela viveu.
O mar, incomodado pela força invisível do vento, forma a revolta das ondas que avançam pesadamente em direção a areia fina e delicada. Atravessam quilômetros para encontrar a paz de um porto seguro.
E então, coragem! Começa tudo de novo.
Assim como o mar, a vida é um eterno desassossego. Só agora ela compreendia.

Sabrina Davanzo




Um comentário:

Anônimo disse...

Sabrina:
Já reparou que chegamos a alguma conclusão, todos os dias?
Num escrever também...
Beijos.
Anny