26 de out. de 2008

Conjunto





Hoje tive uma lembrança súbita. Lembrei da minha própria existência.
Veio-me a plena consciência de que faço parte de um enorme mundo habitado por outros tão iguais e tão diferentes.
Impossível continuar olhando só para mim.
Como não enxergar ao redor onde existe tanta vida quanto dentro de mim mesma? Como não pensar que em cada um que vira uma esquina pulsa um coração com seus ritmos acertados?
Eu que sou várias, de repente me vi em cada um desses peitos arfantes que carregam dentro de si um universo de experiências, temores, sonhos.
E eu que sou dúvidas, me vi em cada um desses pensamentos.
Milhares de rostos se cruzam todos os dias e muitos nunca voltarão a se encontrar. Só aquele instante. O momento de atravessar a avenida, a entrada e a saída.
Como não captar a essência de um ser tão parecido com você, que funciona com os mesmos mecanismos...
Indiferença. Por ser indiferente ontem não notei o sorriso da velhinha que se equilibrava sobre um salto, talvez saudosa dos tempos da juventude.
Por indiferença ontem também não notei o olhar desolado da mãe que saiu para trabalhar e deixou o filho ardendo em febre em casa.
Eu. Eu que tenho os maiores problemas do mundo. Todos eles sob minhas costas tão frágeis.
Eu que sou incapaz de olhar para quanto peso há nas costas dos meus semelhantes. Hoje me dei conta da nossa fragilidade.
Senti vontade de gritar no meio da calçada que eu não sou melhor que ninguém. Queria poder abraçar todos, inclusive a mulher mal vestida e suja que espera esmola no sinal.
"Pode me dar uma moeda?" Acha-se ela digna somente dos restos?
Não merece a mesma parte que me cabe, uma mulher tão igual a mim?
Observando as pessoas vejo que tenho um pouco de cada uma delas, e quanto mais tento ser eu mesma, mais me distancio dessas tantas outras que me dão forma.
Não quero ser indiferente. Quero me reconhecer em cada rosto no meio da multidão. Quero ter a certeza de que caminho entre seres tão humanos quanto eu mesma apesar de, na maioria das vezes, agir por um instinto quase animal.

Sabrina Davanzo




Um comentário:

Anônimo disse...

Sabrina, môr. Li seu blog. Gostei. Gosto do seu jeito de escrever, assim como gosto do seu jeito de ser. Só acho que anda sensível demais, môr,
assim você se machuca.

Beijo do Artur Eduardo.