Eu tenho um cachorro chamado Nino. Nino foi adotado por mim
depois de uma vida de maus tratos e abandono nas ruas. Por conta disso, é
um cãozinho medroso, inseguro, que não permite que ninguém se aproxime dele.
Ele não é agressivo, não morde, não avança, apenas tenta se esconder e fugir o máximo
possível de qualquer contato.
Há pouco mais de um ano e meio estou solteira e nesse tempo
tenho conhecido muitos caras. Obviamente a maioria não passou de
encontros casuais em lugares impessoais, onde eu percebi, já de início, que não
havia nada de especial. Mas teve aqueles (únicos) com os quais eu senti uma
conexão diferente, uma afinidade maior, e por isso permiti que entrassem na minha vida.
Para esses eu abri a porta da minha casa, quis saber deles e
falei de mim sem máscaras, no conforto
do meu sofá, na intimidade da minha cama. Esses caras (talvez eles nem se
atentaram a isso) tiveram o prazer de conhecer o Nino.
Obviamente, Nino nunca os recebeu com festa. Nem uma abanadinha
de rabo sequer. Meu cachorro, como já disse, é um profundo conhecedor do
abandono e da falta, já sabe que não deve se entregar tão facilmente. Ao menor
contato que o cara tentava estabelecer, ele corria para debaixo da cama.
Vez ou outra, ele arriscava uma aproximação, com uma
distância segura, talvez só para se certificar de que a dona estava bem na
companhia de alguém que aparentava perigo. Nino não se rendeu às palavras
doces, aos chamados alegres de qualquer um. Sempre os encarou com desconfiança (eu deveria ter agido assim também?).
Esses poucos caras, aos quais eu permiti essa intimidade,
com o tempo, demonstraram não estar prontos para essa entrega. Por vários
motivos não conseguiram se envolver como eu me envolvi e, um a um, eu os vi
partir depois de compartilhar momentos especiais e uma sintonia relativamente rara
de encontrar. Deixei-os ir com a sensação de que mais uma vez eu tentei fazer
parte da vida de alguém e desejei que essa pessoa fizesse parte da minha sem
sucesso.
É triste confessar isso, mas essas experiências têm me
tornado um pouco como o Nino. Cada vez que quebro a cara, fico mais arredia, com
mais medo de me entregar (será que vale a pena passar por tudo
isso de novo?) e me decepcionar. Parece que esconder debaixo da cama é mais
seguro que ficar à vontade em cima dela. Acaba que a afetividade que recebo vai
me moldando. Como o Nino, que só teve experiências traumáticas, eu vou
guardando as cicatrizes desses não-amores, meias-entregas,
quase-relações.
Eu nunca vou deixar de acreditar no amor e no poder de uma
relação em que os dois estão na mesma sintonia, mas tem sido frustrante minhas
tentativas. Essa coisa de “não bateu”, “não é você, sou eu”, “não estou pronto
para isso”, “você é ótima, mas...” me obriga a entrar nesse jogo de
não-envolvimento, do “se ele não me chama, eu não chamo”, “vou sumir para ele sentir falta”, quando na
verdade eu quero ser presença, quero poder mandar mensagem na hora que eu
sentir vontade sem medo de não ser bem recebida. Quero encontrar segunda,
quarta, sábado e quem sabe domingo, se a nossa vontade for essa, sem qualquer
receio de parecer que estamos caminhando para algo mais sério ou perdendo tempo
enquanto poderíamos estar fazendo outra coisa, saindo com outras pessoas.
Definitivamente eu não quero ter que esconder o que sinto
para não assustar o outro.
Quero é poder ser eu mesma e acreditar na nossa entrega. Quero
abrir a porta da minha casa, a minha intimidade, para alguém que decida ficar
não só no sofá vendo filme, mas na minha vida. Quero alguém que tanto eu,
quanto o Nino, nos sintamos à vontade para enroscar as pernas, deitar no colo,
aninhar, sem medo de nos decepcionar.
Eu procuro um amor que goste de cachorro, mas que acima de
tudo goste de se envolver. Procuro alguém que o meu cachorro goste e que se permita gostar de mim.
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